Cerca de 23% das crianças e adolescentes dizem ter sofrido algum tipo de violência sexual online entre 2022 e 2023 no Brasil, é o que aponta a pesquisa inédita do Diagnóstico da Violência Sexual Online – Crianças e Adolescentes, do governo federal. Produzido entre o Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o estudo revela o quadro das violências sexuais praticadas na internet, além de propor ferramentas para o enfrentamento e um guia de boas práticas.
Segundo os dados, do total que dizem já ter sofrido alguma violência sexual online, pelo menos 76% das crianças e adolescentes que são vitimizadas com esse tipo de violência são meninas. A ampla maioria dos predadores, 87%, ainda segundo o estudo, é composta por homens.
Segundo o governo federal, o relatório preconiza a necessidade de “visibilizar, no sistema jurídico brasileiro, a responsabilização para provedores de serviços de internet, plataformas e afins, incluindo sobre a obrigatoriedade de denúncias, detecção e exclusão de conteúdos”.
Outro dado do relatório aponta um conjunto de 16 iniciativas nacionais de âmbito federal correlacionadas à violência sexual online contra crianças e adolescentes. Por outro lado, segundo o documento, “nos 26 estados e DF, não foram identificadas iniciativas estruturadas e visibilizadas sobre o tema”.
Ainda segundo o Diagnóstico produzido pelo MDHC e a PNUD, “as principais dificuldades para o enfrentamento à problemática seriam a falta de regulação e monitoramento efetivo das plataformas digitais e conteúdos hospedados, as condições socioeconômicas da população, apontadas como fatores de risco à produção e compartilhamento de imagens abusivas e o déficit de letramento digital das famílias para acompanhamento de crianças e adolescentes e delas próprias para a sua autoproteção”.
A base de dados da pesquisa inclui, entre as fontes, relatório do Disque 100, coordenado pelo MDHC. Entre 2022 e 2023,o Disque 100 registrou 6.364 denúncias relacionadas a violência sexual online contra crianças e adolescentes.
A iniciativa do MDHC tem o objetivo de avaliar a atuação do Brasil no enfrentamento da violência sexual em ambientes digitais, envolvendo sociedade civil, União, estados, municípios e Distrito Federal. Outra prioridade é promover ações de engajamento e capacitação de organizações governamentais e não-governamentais nessa pauta.
O estudo busca contribuir para o fortalecimento de políticas públicas e iniciativas privadas voltadas à proteção integral de crianças e adolescentes na internet. O diagnóstico mostra que, apesar dos avanços no marco legal e nas ações de prevenção, o Brasil ainda enfrenta graves desafios para proteger esse público no ambiente digital. Segundo o documento, a violência sexual online apresenta características próprias que exigem novos marcos regulatórios, respostas tecnológicas e estratégias de acolhimento específicas.
Entre os avanços mapeados, o levantamento destaca o papel da sociedade civil na prevenção e mobilização social. Ressalta, ainda, que em todos os setores é necessária atuação mais colaborativa.
A análise identificou lacunas a partir de seis domínios: políticas públicas e governança (com foco em proteção, reparação e/ou intervenção frente à violência sexual online); justiça criminal (reúne experiências voltadas ao sistema de justiça, incluindo acolhimento de denúncias, investigações, responsabilização de autores e apoio às vítimas e suas famílias); priorização da vítima (com foco em ações centradas no cuidado e proteção de crianças e adolescentes vítimas, bem como de seus familiares); responsabilidade da sociedade (inclui experiências promovidas por organizações da sociedade civil que contribuem para o enfrentamento da violência sexual online); responsabilidade do mundo corporativo (práticas desenvolvidas por empresas e instituições do setor privado no âmbito da responsabilidade social empresarial); atuação da mídia e comunicação (estratégias midiáticas e comunicacionais comprometidas com a ética e os direitos da infância e adolescência).
A iniciativa integra o Projeto PNUD BRA/18/024 – “Fortalecimento da garantia do direito à vida e da redução da violência contra crianças e adolescentes no Brasil” e foi conduzido pelo Observatório da População Infantojuvenil em Contextos de Violência da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (OBIJUV/UFRN).
A coordenadora-geral de Enfrentamento às Violências da Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (SNDCA), Célia Nahas, explicou que o estudo não se limita a mapear a violência sexual, mas ajuda a ampliar o olhar para outras violações no ambiente digital. “É preciso compreender que a internet, além de espaço de oportunidades, também pode ser um território de riscos. Crianças e adolescentes enfrentam situações de exploração, aliciamento, trabalho infantil e até incentivo à automutilação”, avaliou.
Também foi apresentado o Banco de Boas Práticas, plataforma que reúne experiências bem-sucedidas no enfrentamento à violência sexual online, selecionadas com base em critérios como efetividade, impacto, inovação e alinhamento com tratados internacionais de direitos humanos. O objetivo é compartilhar conhecimentos e fortalecer ações para proteger crianças e adolescentes nesse contexto.

					

